sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

MOMENTO TEXTUAL

Fábula das Borboletas e do fogo




Certa noite, as borboletas reuniram-se ao redor de um lago de águas límpidas, com a luz da lua iluminando suas asas. Aquela luz elas conheciam bem, ela invadia o lago em certas noites, e elas sentiam-se convidadas a sobrevoarem todo o entorno do lago. A luz penetrava em seus olhos e as faziam vibrar de uma harmonia suprema, assim, elas compreendiam a lua e a noite. Mas aquela noite trazia um mistério, uma ânsia, a qual elas nunca puderam compreender e que as incitava a sobrevoar os domínios proibidos, onde vivam os humanos e assim o fizeram. Depois de terem conhecido este estranho povo viram uma luz, uma luz que não vinha do sol ou da lua, mas que também era quente e vívida, desde então elas se reuniam no lago e conservaram a curiosidade de conhecer a natureza do fogo. Diziam: - Que haja alguém que nos explique como é, realmente, o fogo.



Annabela, uma bela e inteligente borboleta, prontificou-se a ir ao castelo e, de longe, viu a chama da vela, ela também pesquisou em livros o que seria o fogo. Voltou e transmitiu, o quanto pôde, as impressões que lhe ficaram. Annabela estava muito entusiasmada, descrevia a pequena chama que observou de acordo com o que havia estudado. Dizia: - O fogo é o produto da reação de combustão de um combustível em situações apropriadas, como o clima seco e a presença de ventos, pois o ar é de extrema importância. O que Annabela dizia fazia sentido, mas tal descrição, por algum motivo não parecia contemplar a beleza do fogo. As borboletas sentiam que faltava algo então, Mab, a borboleta rainha, que presidia à reunião, julgou-as insuficientes e disse:- Annabela, linda criança, sabes que admiro tua dedicação e entusiasmo, porém compreendemos que os fenômenos da vida vão além da visão científica, cálculos e fórmulas não bastam para entendê-los. Em verdade digo-te que nada sabes sobre o fogo! - sentenciou. Annabela não compreendia as palavras da rainha Mab, ela sabia traduzir o significado das palavras que a rainha dizia, mas o sentido escapava à sua limitada compreensão, mas sabendo da grande sabedoria da rainha se juntou às outras na espera de uma solução para a questão.  



E assim, partiu outra borboleta, mais velha e experiente. Ela se chamava Morgana, conhecida entre as borboletas por sua criatividade e ousadia, a mais devota à Grande Mãe natureza, ela sabia do poder do fogo, o que ele representava para a Grande Mãe. Conhecedora das antigas artes, ela se aventurou no castelo, chegou a tocar na vela, sentiu o calor do fogo e, ali diante da pequena chama pediu à Deusa que a ajudasse a compreender o sentido do fogo, e voltando, também deu as suas impressões. Morgana falou da importância do fogo para a natureza, para o equilíbrio, para a transformação do mundo. Disse ela: O fogo é um dos elementos que regem tudo que existe e é necessário para a transformação da matéria em energia e cinzas. A nossa Grande Mãe sabe do seu poder, por isso nos mantém afastadas dele, pois ele pode também ser muito destrutivo.



Neste momento a perplexidade das borboletas era tamanha que um silêncio governou até o momento em que a rainha se pronunciou. Mab: - Morgana, conheço-te a muito, sei da tua admiração pela Deusa, mas não estamos atrás de conforto espiritual ou profecias catastróficas, o que nos inquieta é o nosso total desconhecimento diante deste fenômeno, o fogo. Todas esperamos por esclarecimentos, sabemos dos danos que ele pode causar, pois já vimos ele consumindo nossas florestas, mas o que nos trazes é pouco, muito pouco. Precisamos de mais! - exclamou a borboleta rainha. Morgana se revoltou, sentiu-se menosprezada pela rainha, ou pior sentiu que a própria Deusa tinha sido menosprezada! Desta forma ela injuriou e praguejou contra a rainha Mab, amaldiçoando todas as borboletas do conselho, e partiu jurando perante todas que vingaria sua Deusa e, secretamente, seu orgulho ferido.



A rainha ficou desolada, pois a reunião que serviria para unir as borboletas em prol de lidar melhor com os desafios do mundo estava em ruína, pois além de estarem sem respostas, ainda estavam surgindo conflitos no grupo, pois não apenas Morgana, mas também outras borboletas simpatizantes da Deusa juntamente com as alheias ao desejo de saber cochichavam pra lá e pra cá, causando intriga e um falso pudor em todas as outras. Tanto que a rainha Mab decide acabar com o conselho e mandar todas embora, cuidar de suas vidas. 



Porém, quando todas se preparavam para partir uma jovem surgiu em meio às borboletas, seu nome era Melissa. Melissa se encontrava ébria do desejo de saber como seria realmente o fogo assim como um grande número de borboletas.  Ela disse: Majestade, por favor, espere! O que desejas pequena criatura? Não vedes que estamos todas esgotadas? Não há nada pior que esta angústia: saber que não sabemos de nada! – disse a rainha. Não! Não creio nisto! Que bom que não sabemos! Pois, se o soubéssemos não haveria sentido em nossa existência. É justamente por não saber, que procuramos, experimentamos, nos movimentamos e mesmo que não consigamos descobrir o que queremos certamente apreenderemos algo a mais. Na nossa busca não há resultados e o fim é certo e único, mas nada pode nos tirar a beleza do caminhar! E neste percurso por vezes nos deparamos com momentos, experiências e fenômenos que dão sentido a nossa existência, pois podemos chamar a vida de bela nesta brecha de tempo que nos é concedida! Eis o esplendor do(e) ser – retrucou Melissa. Rainha Mab: Sábias palavras criança, mas o que são elas além disso? Palavras, meras palavras! O que tu tens a nos oferecer? Que grande contribuição podes dar aquelas que te precederam na vida e na busca do saber? Acreditas que podes dialogar com a nossa experiência? Melissa: Sim, o diálogo não pede permissão à experiência, ele a constitui. O pior dos males que pode ocorrer a um ser é a estagnação, o engessamento, a cristalização de suas inúmeras possibilidades. Podem não acreditar em mim, posso não saber das verdades, do futuro, da falha, do erro, mas de que me adianta parar por aqui? Minha base é a incerta? Não importa eu vou!



Assim, Melissa partiu na sua busca de desvelar os mistérios do fogo. Ela encontra o fogo, pousa sobre a chama, abraça-a com as suas asas, faz-se uma só com ela até se tornar totalmente vermelha e incandescente. Quando a borboleta rainha, à distância, a viu assim totalmente transfigurada, totalmente luz e calor, proferiu palavras que entoaram emoções carregadas de pesar e este estrondo silencioso de alguma forma foi sentido por todas. Mab: - Depois de muito anos, muitas tentativas, muitas frustrações, agora esta criança conseguiu saber o que queríamos. Ela é a única que nos pode dizer realmente o que é o fogo, pois agora ela o é!


Andreas Lux

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